34 Treinamento resistido e adaptações cardiológicas

Data:

A utilização de nomes de alterações patológicas cardíacas para designar adaptações fisiológicas ao treinamento deve ser evitada porque são processos distintos. As adaptações aos esforços não apresentam consequências deletérias à saúde.

C. Mihl, W.R.M. Dassen, and H. Kuipers; 2008 Netherlands Heart Journal, Volume 16, Number 4, April 2008

Comentários: José Maria Santarem

A remodelação cardíaca é inicialmente definida como um conjunto de adaptações fisiológicas ou patológicas. Os autores se propõem a realizar uma revisão de literatura focada nas diferenças entre as adaptações cardíacas fisiológicas e patológicas, e também nas diferenças no caso de atletas de força e de resistência.
O coração se adapta em tamanho, forma e função às alterações hemodinâmicas. Os mecanismos de adaptação envolvem aspectos mecânicos, bioquímicos e moleculares.

HIPERTROFIA FISIOLÓGICA

Quando ocorre aumento das solicitações hemodinâmicas nos períodos de exercício, basicamente ocorrem alongamento e tensão nas células cardíacas, que respondem com hipertrofia, caracterizada por aumento das miofibrilas nos cardiomiócitos.

HIPERTROFIA PATOLÓGICA

Quando ocorre aumento crônico das solicitações hemodinâmicas, como no caso de doença hipertensiva, valvopatias, comunicações intra-cavitárias e também nas doenças genéticas, a hipertrofia apresentada é diferente. As diferenças básicas são a ocorrência de fibrose intersticial e necrose de cardiomiócitos.

Comentário: Nas doenças em que ocorre sobrecarga de pressão como por exemplo a estenose aórtica ou a hipertensão arterial sistêmica, ocorre hipertrofia das paredes do miocárdio com redução das câmaras cardíacas, o que recebe o nome de “hipertrofia concêntrica do miocárdio”.

Os novos sarcômeros são depositados “em paralelo” com relação aos pré-existentes, aumentando a força de contração dos cardiomiócitos. A espessura do miocárdio ultrapassa com frequência o limite da normalidade .

Na evolução do processo costuma ocorrer diminuição da espessura das paredes cardíacas e diminuição da força de contração, levando á chamada cardiomiopatia dilatada. A insuficiência cardíaca pode ocorrer nas duas fases das adaptações, assim como o óbito, que pode ocorrer por infarto ou parada cardíaca (arritmia grave).

Por outro lado, nas doenças em que ocorre sobrecarga de volume, como por exemplo na insuficiência mitral, a hipertrofia do miocárdio é acompanhada de aumento das câmaras cardíacas, caracterizando a “hipertrofia excêntrica do miocárdio”.

Os novos sarcômeros são depositados “em série” com relação aos pré-existentes, levando ao alongamento dos cardiomiócitos. Na evolução também ocorrem insuficiência cardíaca, infarto ou arritmia.

ATLETAS DE RESISTÊNCIA

Atletas de ciclismo, corrida e triathlon são submetidos a longos períodos de sobrecarga de volume no ventrículo esquerdo, caracterizada por aumentos importantes de frequência cardíaca, de volume sistólico, de débito cardíaco e aumentos moderados de pressão arterial média. Esse tipo de exercício é classicamente considerado “dinâmico”.

A resposta do coração é aumento importante de câmara ventricular esquerda e grande aumento da espessura da parede do miocárdio, sendo os novos sarcômeros depositados “em série” em relação aos pré-existentes.

Comentário: pela semelhança dos eventos envolvidos as adaptações cardíacas dos atletas de resistência são frequentemente referidas como “hipertrofia excêntrica do coração”. Essa não é uma conduta recomendável porque não se trata de uma adaptação patológica e não ocorrem efeitos deletérios à saúde.

ATLETAS DE FORÇA E POTÊNCIA

Atletas dedicados ao treinamento de força (treinamento resistido) apresentam períodos breves com aumentos consideráveis da pressão arterial sistólica e diastólica, e aumentos moderados da frequência cardíaca, do volume sistólico e do débito cardíaco.

A resposta cardíaca é uma hipertrofia fisiológica caracterizada por aumento da espessura da parede ventricular, com os novos sarcômeros depositados “em paralelo” em relação aos pré-existentes. A espessura do miocárdio não ultrapassa o limite da normalidade. As câmaras cardíacas apresentam discreto aumento ou não, mas nunca diminuem.

Comentário: novamente pela semelhança dos eventos envolvidos as adaptações cardíacas dos atletas de força são frequentemente referidas como “hipertrofia concêntrica do coração”. O nome de um fenômeno patológico não deve ser utilizado para fazer referência a adaptações fisiológicas sem prejuízos à saúde.

CONCLUSÕES

Os autores concluem que as adaptações cardíacas aos exercícios (fisiológicas) são descritas como diferentes em atletas de força e de resistência, mas na maioria das atividades esportivas as adaptações são uma mistura dos dois modelos. Em nenhuma situação fisiológica as adaptações morfológicas e funcionais se afastam dos parâmetros da normalidade e não há prejuízos para a saúde.

Metodologia, tabelas, gráficos e bibliografia encontram-se no artigo original.

José Maria Santarem
José Maria Santaremhttps://treinamentoresistido.com.br
José Maria Santarem é doutor em medicina pela Universidade de São Paulo, fisiatra e reumatologista pela Associação Médica Brasileira, consultor científico da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte, coordenador de pós-graduação na Escola de Educação Permanente do HC-FMUSP, diretor do Instituto Biodelta, autor do livro Musculação em Todas as Idades (Ed. Manole) e coordenador do site acadêmico www.treinamentoresistido.com.br.

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